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Esse blog tem por finalidade divulgar e valorizar as mais variadas e ricas formas de expressões artísticas, como artes visuais, cinema, dança, música, literatura, e sobretudo, teatro.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Avaliação final do projeto "A gosto de Nelson"


* Reinaldo Lace
**

"Senhora dos afogados" ou "Toda nudez será castigada": qual foi a melhor montagem entre as 17 peças de Nelson Rodrigues, dentro do projeto "A gosto de Nelson", em comemoração ao centenário do maior dramaturgo do Brasil e um dos maiores do mundo em todos os tempos?

1. "A mulher sem pecado" - Primeira peça escrita por Nelson Rodrigues, em 1941, foi montada pela primeira vez, em dezembro do ano seguinte, no Teatro Carlos Gomes - RJ. A montagem, com O Instituto João Aires de Minas Gerais é superior à montagem de 12 anos atrás, com José de Abreu e Luciana Braga nos papéis principais, por ocasião dos 20 anos da morte do autor. Apresentada dentro do projeto "A gosto de Nelson", em comemoração ao centenário de Nelson Rodrigues, a história que gira em torno do excessivo ciúme de um marido por sua mulher, cresceu na marcante interpretação de Paulo Rezende, como Olegário, o marido excessivamente ciumento, com apoio da trilha sonora e iluminação, de Luiz de Filippo e Wladimir Medeiros, respectivamente. Dias 01 e 02 de agosto, no Teatro Glauce Rocha.

2. "Vestido de noiva" - Maior clássico do Teatro Brasileiro; depois de uma encenação pavorosa, com direção de Caco Coelho e Viviane Pasmanter, como Madame Clecy, na Rotunda do Centro Cultural Banco do Brasil RJ, em maio, os ótimos Os Satyros de São Paulo realizaram uma montagem criativa e interessante. Do elenco, só Helena Ignez destoava, como Madame Clecy. Dias 01 e 02 de agosto, no Teatro Dulcina.

3. "Álbum de família" - Um dos bons textos de Nelson Rodrigues foi desfavorecido por uma montagem esteticamente pobre. Poderia ter rendido mais, se a Anômade Cia de Teatro soubesse aproveitar melhor as possibilidades do texto. Dias 08 e 09 de agosto, no Teatro Dulcina.

4. "Anjo negro" - Censurada por dois anos pela Ditadura Militar, a trama que gira em torno do até hoje atual e polêmico tema do racismo, por meio de um homem negro que renega a própria raça e se casa com uma mulher branca, teve no elenco de sua montagem original, em 1946, nomes como Itália FaustaMaria Della Costa e Nicete Bruno. Dos mais fracos textos de Nelson Rodrigues, a Cia de Teatro 3 de Goiás driblou surpreendentemente as dificuldades todas apresentadas pelo texto e foi capaz de uma montagem clara, limpa e objetiva, favorecendo a compreensão do espectador sobre a trama. Mérito do diretor Altair de Souza. Montagem muito superior à montagem esquizofrênica apresentada, em março, no Teatro Dulcina, com Déo Garcez, como Ismael. Dias 08 e 09 de agosto, no Teatro Glauce Rocha.

5. "Senhora dos afogados" - A trama mais complexa (por que não dizer confusa de Nelson Rodrigues), pela mistura de vários temas polêmicos, como assassinato, suicídio, prostituição, incesto, loucura e mistiscismo, ganhou, e muito, ao ser transformada em musical, com temas de Chico BuarqueDjavan e outros compositores brasileiros. O Núcleo Experimental de São Paulo fez jus ao seu nome, proporcionando ao espectador uma experiência marcante. Um trabalho caracterizado ao mesmo tempo pelo arrebatamento e a delicadeza, fazendo-nos ver quão doloroso, porém necessário talvez seja viver e seguir os impulsos dos sentimentos em detrimento da razão. A melhor montagem teatral que o Rio de Janeiro viu até agora. Dias 11 e 12 de agosto, no Teatro Glauce Rocha.

6. "A falecida" - A Companhia Gestão e Produção sob direção e orientação de Diego De León criou uma "A falecida" multifacetada ao dividir entre os atores as várias personagens de uma das melhores peças de Nelson Rodrigues. O diretor soube em sua criação manter e valorizar o que o mítico crítico Décio de Almeida Prado já observara na estreia nacional da peça, em 1953, com Sonia Oiticica e Sérgio Cardoso nos papéis principais.. Uma "ferocidade cômica", "uma força sarcástica e corrosiva" num "instantâneo cômico ou trágico". Dias 15 e 16 de agosto, no Teatro Dulcina.

 7. "Os sete gatinhos" -  Direção sem direção, cenário pavoroso, figurinos incompreensíveis, trilha sonora confusa e interpretações sofríveis. Uma lástima. Pois, trata-se de uma das obras-primas do Anjo pornográfico, que foi completamente desconstruída, tornando-se irreconhecível, para desgosto total do grande público. Nelson não merecia isso. A pior montagem teatral até agora em 2012. E dificilmente, haverá pior. Com a Cia Crstina Yoshie Sato. Dias 18 e 19 de agosto, no Teatro Dulcina.

8. "Boca de Ouro" - O Grupo Prole de Teatro sob a direção competente de Flavia Pucci favoreceu-se de um dos melhores textos de Nelson Rodrigues e criou uma encenação com mais acertos do que erros. A valorização do texto fluiu naturalmente da boca dos atores. Um eficiente Gustavo Engracia (Boca de Ouro), Kelly AlonsoRodrigo SolerThiago Barros, enfim, todo elenco, estavam harmonizados. Cenários e iluminação funcionais. Prazer de ver. Dias 18 e 19 de agosto, no Teatro Glauce Rocha.

9. "O beijo no asfalto" - A Phalante, Goes & Mourão desperdiçou uma das obras-primas de Nelson Rodrigues, com uma encenação burocrática. Foi a decepção do projeto "A gosto de Nelson", em comemoração ao centenário do Anjo pornográfico.  Mas, destaquemos Andrêzza Alves, como Selminha, papel interpretado por Fernanda Montenegro, na montagem original de 1961, que reuniu no mesmo palco Sérgio BrittoÍtalo RossiOswaldo LoureiroMário LagoZilka Zalaberry e uma estreante Suely Franco. Dias  22 e 23 de agosto, no Teatro Dulcina.

10. "Otto Lara Resende, ou Bonitinha, mas ordinária". A peça mais popular de Nelson Rodrigues e encenada pela primeira vez, em 1964, cresceu em encenação despojada e vigorosa do experiente diretor Eduardo Wotzik. Centro de Investigação Teatral voltou aos  palcos revitalizado, provando que o teatro nunca é o mesmo, sempre muda. E a história de Edgar, dividido entre o bem e o mal, é contada de forma quase magistral, e seu interpréte, encarna a personagem com força extraordinária. Ísio Guelman, perfeito. Clarice Niskier, muito bem no papel vivido na montagem original por Tereza Rachel. Assim, como Henri Pagnoncelli. Se a falta de elementos cênicos é quase inexistente, é só para dizer o quanto o texto vale por si só. Puro deleite. Dias 22 e 23 de agosto, no Teatro Glauce Rocha.

11. "Toda nudez será castigada" - Uma das obras-primas entre as 17 obras dramáticas de Nelson Rodrigues, a primeira montagem, em 1965, teve Cleyde Yáconis - esta dispensa comentários-, como a prostituta Geni. Na adaptação para o cinema, a personagem ganhou fama na interpretação inesquecível de Darlene Glória. Com a Armazém Companhia de Teatro, uma das mais conceituais do país, a peça ganhou encenação, que atinge seu ponto máximo na sua concepçãp estética, valorizando o visual, sem colocar o texto em segundo plano. Os desempenhos são irregularesMas Patrícia Selonk compreende bem as verdades de Geni e a constrói com segurança e doçura. Ela cria uma Geni, como não poderia deixar de ser, mulher da vida, porém, vítima dos próprios sonhos, enganos e ilusões. E até mesmo ingenuidade. A música do talentosísssimo Arrigo Barnabé é excepcional. E tudo orquestrado pelas mãos maravilhosas do diretor Paulo de Moraes. Dias 25 e 26 de agosto, no Teatro Dulcina.

12. "A serpente" - Último texto escrito por Nelson Rodrigues, a trama de final surpreendente - se é que se pode falar de supreendente em se tratando de Nelson Rodrigues - encenada pelo Teatro do Pequeno Gesto, tem seu melhor nos desempenhos dos talentosos atores Alexandre DantasClaudia VenturaMarcos FrançaPriscila Amorim Vilma Melo. A direção de Antonio Guedes impõe certo frenesi à cena, o que beira uma exarcerbação desnecessária. Dias 30 e 31 de agosto, no Teatro Dulcina.

*É convidado especial da FUNARTE (Fundação Nacional de Artes) para cobertura do evento "A gosto de Nelson"
**Não assistiu, por problemas de saúde às apresentações de "Viúva, porém honesta", "Anti-Nelson Rodrigues", "Dorotéia". "Perdoe-me por me traíres" e "Vasa 6".

                                                                       (Reinaldo Lace, em 01/09/2012)

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